terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Diferenças entre o sof sensor e o enlite

Em junho de 2012 comecei o meu tratamento com a bomba de infusão de insulina Paradigm 722 da Medtronic, que recebi do SUS via processo judicial, de forma definitiva. Ainda não havia sido lançada no Brasil a VEO, bomba de insulina com suspensão automática da infusão em casos de hipoglicemia, tampouco o sensor enlite que pode ser utilizado com qualquer uma delas.

Assim, o meu monitoramento sempre foi feito através do sof sensor, o primeiro modelo de sensor de glicose intersticial da Medtronic. Demorei cerca de 6 meses até me adaptar completamente a ele, e conhecer na prática todas as suas idiossincrasias, conforme postagens anteriores desta seção "Dicas de bomba de insulina e de sensor".

Quando a VEO começou a ser comercializada no Brasil, em meados de 2014, conversei com meu médico a respeito da troca do modelo de bomba e de sensor, porque mesmo melhorando drasticamente o meu controle glicêmico (a minha hemoglobina glicada antes da bomba ficava em níveis acima de 7,5% e com muitos espasmos hipoglicêmicos, e depois da bomba a glicada se reduziu a menos de 6,5,% e sem hipoglicemias graves), a minha glicemia costuma cair de madrugada, período de pior desempenho do sensor.

Na ocasião ele me alertou acerca da real eficácia do novo sensor, questionando se as medidas eram acuradas o suficiente para que a suspensão da infusão por hipoglicemia não acarretasse hiperglicemia posterior em função de erro na medição, e me aconselhou a fazer um teste com o enlite antes de solicitar a troca ao SUS.

Usando o novo sensor durante este mês, verifiquei que, na prática, há algumas diferenças de ordem mecânica que refletem em singela melhoria de desempenho, mas que não são suficientes para classificar o enlite como muito superior em acurácia ao sof sensor.

Enquanto a instalação do sof sensor ocorre num ângulo de 45º a 60º, a do enlite é em 90º, o que facilita a inserção da agulha aplicadora do sensor e diminui as chances de machucados durante a entrada na pele, que interferem na acurácia das medições. Com o sof sensor tive sangramentos em algumas ocasiões, e usando o enlite não ocorreu sangramento em qualquer das aplicações.


aplicação do sof sensor



 aplicação do enlite


Por outro lado, para fazer a instalação no braço (região em que uso o sensor) o aplicador do sof é melhor para a retirada da agulha pelx próprix usuárix. Há dois vídeos no youtube com demonstração por usuárixs da inserção do sensor no braço. Mas no video do enlite, a diabética necessita pedir ajuda ao companheiro para retirada da agulha, enquanto que no video do sof o diabético faz toda a aplicação sozinho:

video sobre aplicação do enlite

video sobre aplicação do sof sensor

O enlite possui dois adesivos (inexistentes no sof sensor) - um que fica abaixo do minilink e outro que o recobre por cima - que ajudam a manter o transmissor colado à pele. Considerando que quanto menor a mobilidade do transmissor melhor a medição da glicemia, este fato também colabora para o bom desempenho desse sensor. Mas esses adesivos dificultam a retirada do sensor da pele, e o que vai por cima deixa uma cola residual no transmissor.

Há um outro adesivo, autônomo em relação ao enlite, destinado a mantê-lo completamente imóvel, que também pode ser utilizado com o sof sensor, mas que é de difícil colocação no braço por quem faz a aplicação sozinhx por ser muito mole. Em todas as instalações precisei do auxílio do meu companheiro para colar este adesivo.


O número do isig, que a grosso modo corresponde à quantidade de células do líquido intersticial que estão em contato com o sensor dentro da pele, a partir das quais a medida de glicemia é calculada, é maior no enlite. Teoricamente, considerando que maior número de células disponíveis para a aferição da média da glicose resultaria em mais dados para se analisar e, portanto, maior acurácia, essa seria uma grande vantagem. Mas na prática, esse isig maior não produz os resultados imaginados.
 
Tanto com o sof sensor quanto com o enlite, as medidas das 6 primeiras horas de uso e das últimas 12 costumam se distanciar bastante da medida aferida pelo dextro. Em condições de normalidade, essa diferença varia entre 10 e 20 mg/dl, mas nas primeiras 6 horas e últimas 12 (principalmente nessas) podem chegar a uma diferença de até 100mg/dl. Isso ocorre com o uso de ambos os sensores. Também nos casos de oscilações glicêmicas mais acentuadas os dois sensores deixam a desejar.
 
Durante a madrugada, período em que geralmente não tomamos muita água (o que diminuiria a quantidade do líquido intersticial e também o número do isig), o sensor costuma apontar uma medida inferior àquela do dextro. Muitas vezes a minha bomba apita avisando que a glicemia está abaixo de 70 mg/dl, quando, na verdade, ela está próxima de 100 mg/dl. E também ocorrem erros para cima, o que já me causou hipoglicemias ao despertar por bolus de correção desnecessário. Isso ocorre com o sof sensor, e também com o enlite.
 
Procurando por publicações acerca do tema, encontrei um estudo (1) que aponta que o enlite tende a indicar uma medida menor do que a real em qualquer situação, e que o sof sensor indicaria glicemia maior em casos de hipoglicemia e menor em casos de hiperglicemia. A diferença absoluta média em relação à glicose apresentada e aquela medida pelo sensor seria de 15% para o enlite e de 12% para o sof sensor. Ou seja, cada sensor teria suas falhas de acurácia de acordo com situações específicas: o enlite, o tempo todo para baixo, e o sof sensor em situações de oscilações extremas, mais alta nas quedas e mais baixa nas elevações de glicemia.
 
Mas na prática, essas pequenas diferenças parecem inexistentes. Achei o enlite igualmente funcional em relação ao sof sensor, com bom e mau desempenho em situações bem parecidas, embora o enlite tenha funcionado por mais tempo justamente pelas questões mecânicas: entrada da agulha em 90º e fixação maior do sensor e do transmissor por adesivos. Na parte tecnológica parecem absolutamente iguais!
 
De qualquer forma, e apesar das falhas em relação às horas de uso, oscilações glicêmicas mais acentuadas e período noturno, somente utilizando a bomba com o monitoramento da glicose intersticial consegui evitar as crises espasmódicas que me acometiam todas as semanas. Aprendendo as nuances de funcionamento do sensor, qualquer um deles é excelente (principalmente para assintomáticxs como eu) e auxilia a melhorar o controle da glicemia. Assim, ainda analisarei melhor com meu médico se trocaremos ou não o modelo do sensor. 
 
Quanto ao modelo da bomba, não sinto confiança ainda para utilizar a VEO, pois me parece que o desempenho do sensor não é suficientemente acurado para evitar hiperglicemias posteriores a uma suspensão desnecessária. Neste aspecto, sinto-me mais segura realizando dextro após aviso de hipo da bomba e, com suspensão (não automática) apenas em situações de queda extrema e em alta velocidade.
 
 

6 comentários:

Débora Aligieri disse...

Conversa que tivemos eu e a médica Josély Graziano no facebook sobre o assunto:

Josély: Débora Aligieri, minha experiência com meus pacientes é outra: muitos se recusavam a usar o Sof, e, ao migrar para o Enlite, tiveram melhores resultados, não só pela facilidade de aplicação e tamanho menor quanto pela maior acurácia do sensor.
Quanto à Veo, ela só suspende se e quando vc permitir. A suspensão automática só acontece após vários"avisos" de hipo. Ainda assim, vc pode religá-la a qualquer momento (após correção da hipo ou caso haja discordância entre a glicemia capilar e a intersticial). Bjs!

Débora: Entendi, Josély Graziano, legal você me dar essa explicação sobre a Veo, obrigada! Daí a bomba parece ser mais segura. Em relação aos sensores, grande parte das pessoas com que converso dizem que sentiram diferença com o enlite mesmo, mas tenho conversado com algumas pessoas que, assim como eu, não perceberam nenhuma mudança. Num outro grupo de bomba onde publiquei esse texto também uma pessoa disse que achou o enlite "mil vezes melhor" e outra disse que apesar de melhor não é tão acurado quanto imaginava. Repito aqui o que disse lá, a ideia do texto não é promover um concurso para eleger se o sof ou o enlite é melhor, mas tentar questionar um pouco as promessas do marketing do Capital. A minha opinião é que, para o meu caso específico, ambos funcionam com igual desempenho. Mas para outras pessoas pode não ser o mesmo. Para o meu caso trocar o sof pelo enlite é trocar 6 por meia dúzia, porque o enlite funciona tão bem quanto o sof, e também falha da mesma forma nas situações que narrei (primeiras e últimas horas de uso, oscilações mais acentuadas e período noturno). Eu esperava medições muito mais acuradas, e isso não aconteceu. Mas eu tenho 38 anos, trabalho sentada, e pratico exercícios sem impacto. Em situações diferentes, como no caso de crianças que brincam e se mexem muito mais que uma pessoa com a minha idade, o fato do enlte estar mais colado à pele deve mesmo resultar em maior acurácia. Essa foi a sensação que muitas mães tiveram, de que as medições do enlite batem mais com o dextro. Mas como aponta o estudo que coloquei na postagem, a diferença da acurácia entre eles é quase inexistente. Não sei se você lembra daquela propaganda da Feiticeira em que ela dizia "não é magia, é tecnologia", neste caso eu diria que não é tecnologia, é mecânica. A grande "tecnologia" aplicada ao enlite para funcionar melhor - em alguns casos - são dois adesivos que mantém o sensor e o transmissor mais fixos, e a colocação em 90º que evita as chances de sangramento, que também interfere na acurácia. Mas no meu caso, os sangramentos com o sof também não são tão frequentes. E a agulha do enlite não é menor, ela dá essa impressão porque quando sai da pele já está protegida, e o do sof, completamente à vista, mostra o seu tamanho. Assim, levantando o véu do marketing, o que temos é um sensor que ainda não resolveu os problemas relacionados justamente ao diabetes: oscilações glicêmicas. De qualquer forma, sof ou enlite ainda são grandes aliados ao controle da glicemia quando tomamos o cuidado de questionar um pouco a máquina, sabendo as situações em que ela pode falhar. E acho que podemos provocar um pouco a medtronic para que de fato seja desenvolvido um sensor com tecnologia capaz de manter a acurácia nos casos em que os atuais falham. Essa é a intenção da postagem. Você me conhece né Josély, sou garota enxaqueca! Mais uma vez, obrigada pela explicação! Você bem que podia colocar esse comentário no blog né....Bjs

Débora Aligieri disse...

Josély: Sabe, Débora, meu marido, que é engenheiro mecânico, sempre me diz que não se pode confiar totalmente na tecnologia (qquer que seja ela). E é verdade: é preciso senso crítico e muito auto conhecimento, afinal, se o corpo humano tantas vezes falha, que dirá uma máquina. Tb acho que há muito ainda q avançar. Esse novo sensor já é um grande avanço, mas tb falha, isso é certo. Acredito q a indústria está sempre buscando aperfeiçoar os "devices" (até pela concorrência), e, enquanto isso, vamos nos mantendo da melhor forma possível com as ferramentas que nos são disponibilizadas...
Qto ao blog, pode copiar meu textinho, feel free! Bjs!

Débora Aligieri disse...

A medtronic entrou em contato comigo através de sua representante de marketing e blogueira de diabetes Caroline Naumann e me enviou dados do estudo ASPIRE In-Home, publicado no The New England Journal of Medicine em junho de 2013, que demonstrou que o recurso da suspensão automática poderia reduzir a ocorrência de hipoglicemia noturna em cerca de 30%, abreviando o tempo de permanência em níveis de glicemia abaixo de 70mg/dl em 37,5%, conforme relatam o Dr. Walter José Minicucci e a Dra. Solange Travassos de F. Alves neste artigo: http://ebook.diabetes.org.br/component/k2/item/58-o-papel-das-bombas-de-insulina-na-estrategia-de-tratamento-do-diabetes-tipo-1-dm1

Rosana disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Rosana disse...

Parece que o sensor Enlite tem um adesivo que deixa o mini-link preso, é o que acontece?
Precisamos ainda continuar usando película ou esparadrapo para sensor Enlite não desgrudar e o mini-link não cair?

Débora Aligieri disse...

Oi, Rosana.

Apesar do enlite ter um adesivo para fixar melhor o minilink ao sensor, sem o adesivo maior por cima do minilink ele fica penso. Com o enlite então são 3 adesivos para deixar o minilink bem fixo: um sobre o sensor (com o buraco no meio) colocado antes de ligar o minilink a ele, outro mais estreito sobre a parte central do minilink, e o terceiro maior cobrindo o minilink por inteiro. Com o sof, dá pra colocar um adesivo cortado no meio sobre o sensor e depois um inteiro cobrindo todo o minilink, também ajuda a manter o minilink mais fixo e o desempenho melhor do sensor, fiz isso durante este ano inteiro, e as medidas melhoraram bastante. Dê uma olhada nesse post que indico agora, e veja as observações que fiz lá sobre o assunto: http://deboraligieri.blogspot.com.br/2015/10/a-incrivel-fabrica-de-bomba-de-insulina.html

Abraços,

Débora